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Estudantes de Direito enviam mensagem ao STF e pedem respeito à população indígena do Jaraguá

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Guaranis do Pico do Jaraguá, zona Oeste de São Paulo lutam contra reintegração de posse.  Estudantes, instituições e movimentam se solidarizam com as comunidades indígenas

Por Rosinha Martins| 05.05.2015| O Pico do Jaraguá, zona Oeste de São Paulo, tem se tornado palco de conflito desde que o Tribunal Federal da 3ª Região autorizou a reintegração de posse.  Segundo lideranças indígenas, a FUNAI tem a demarcação da terra garantida por estudo antropológico realizado em 2013 e necessita somente do reconhecimento do Ministério da Justiça.

Os guaranis reivindicam um território de 532 hectares em extensão, composto pela área de ocupação de cerca de 130 famílias, 700 pessoas da quais  400 dessas são crianças,  e pela área de preservação do Parque do Pico do Jaraguá.

Para o Cacique Ari Augusto Martim, conhecido como Karai, que chegou em São Paulo com 15 anos, o fenômeno da urbanização afetou de forma significativa a vida dos indígenas. “Quando chegamos aqui, só existia a rua turística (acesso ao Pico do Jaraguá). Depois de dois anos, abriu uma avenida que separou em duas as nossas aldeias. Em 1978, abriu a Rodovia dos Bandeirantes”, recordou.

Estudantes da Faculdade de Direito  do Largo São Francisco enviaram carta ao presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandoviski, reivindicando seu parecer contrário à reintegração de posse para garantir o direito à terra aos indígenas e o respeito ao seu modo de vida tradicional. “Se faz necessário ressaltar que a reintegração de posse da aldeia evidencia o caráter devastador da política de especulação imobiliária vigente em toda a cidade de São Paulo. A área em questão vem sendo alvo de uma grande valorização fundiária, portanto a demarcação da região é uma medida extremamente necessária para garantir o direito à terra e ao modo de vida tradicional da comunidade ali presente”, diz trecho da carta.

 De acordo com informações do Estadão, é possível que Lewandoviski tenha parecer favorável à suspensão da medida, pois em marco deste ano,  o STF suspendeu a decisão que determinava a retirada de indígenas de uma fazenda, no Mato Grosso do Sul.

A Carta conta, ainda,  com apoio de outras instituições e movimentos como o Serviço de Assessoria  Jurídica Universitário (SAJU), o Centro Acadêmico XI de Agosto, a Clínica de Direito Ambiental Paulo Nogueira Neto (CPaNN), o  Quilombo Oxê e  o Centro Acadêmico Florestan Fernandes – FESPSP.

Leia a íntegra da mensagem

São Paulo, 4 de maio de 2015.

Caro professor titular Ricardo Lewandowski,

Como o senhor bem sabe, existem indígenas na cidade de São Paulo que estão sofrendo um duro processo de reintegração de posse de suas terras na Aldeia do Sol Nascente, no Jaraguá, zona oeste do município. Dessa forma, nós, estudantes da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, pretendemos, por meio da presente carta, manifestar nosso posicionamento acerca do tema, visto que a decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal nesse caso  pode vir a gerar impactos sociais irreparáveis. Entendemos que a ferramenta jurídica necessária para se resolver o litígio não deve ser apartada da realidade, mas sim ter como finalidade o equilíbrio e bem-estar social. Para este caso em específico, cabe lembrar a importante decisão do ministro do STF Victor Nunes Leal, em 1961, na qual já advertia acerca dos conflitos sobre terras indígenas: “não se está em jogo, propriamente, um conceito de posse, nem de domínio, no sentido civilista dos vocábulos; trata-se do habitat de um povo”.

Para os guarani, este “habitat” ideal é o que chamam de Tekoa, conceito que abrange dimensões cosmológicas, ecológicas e sócio-históricas. Isso porque se trata de espaço de mata preservada para a caça ritual, agricultura e coleta de ervas e materiais para o artesanato, e também do espaço sócio-político de moradia, festas, lazer e rezas. O  direito originário à Tekoa é garantido aos guaranis por meio da Constituição, quando esta prevê que os indígenas tenham direito à organização social, costumes, línguas, crenças e tradições. Dessa forma, um voto que determine pela reintegração de posse acarreta na impossibilidade desses  índios  viverem sua vida de acordo com seus costumes milenares; isto é, a reintegração gera um sério risco de grave e irreparável lesão a uma forma de vida protegida pela Constituição.

Além disso, a terra dos guaranis no Jaraguá já foi reconhecida pela FUNAI e para isso, foram precisos aprofundados estudos históricos, geográficos e antropológicos. Essa minuciosa pesquisa realizada por peritos não foi questionada na esfera administrativa nem na judicial. O único problema, portanto, é a conveniente e injustificada demora do Ministério da Justiça em determinar a demarcação; enquanto o prazo de 30 dias a partir do término do estudo da FUNAI é largamente desrespeitado, os conflitos fundiários se prolongam e se intensificam.

Neste caso concreto, o conflito chegou a tal ponto que os indígenas, por terem em mente que a FUNAI já reconheceu suas terras e por se negarem a abrir mão do pouco espaço que ainda têm para exercer seu modo de vida tradicional, afirmaram que, caso ocorra a reintegração, pretendem resistir  com suas próprias vidas, se necessário. Isto é, caso o Supremo Tribunal Federal julgue a favor da reintegração de posse, ignorando o extenso laudo antropológico da FUNAI, vai ser responsável não só pela eliminação simbólica e cultural advinda da separação do guarani de sua tekoa, como também pela eliminação física que poderá surgir dos confrontos entre os indígenas e a Polícia Militar. A decisão a qual estamos tratando envolve não só o interesse da sociedade brasileira em garantir a coexistência pacífica de sua pluralidade étnica, mas também a vida de centenas de cidadãos indígenas que habitam a área do Jaraguá. Dessa maneira, esperamos, vigorosamente, que o senhor adote posicionamento similar ao que já adotou nas suspensões de reintegração de posse das comunidades Kurusu Ambá, no Mato Grosso do Sul, partindo da presunção de legitimidade do trabalho da FUNAI e garantindo sua produção de efeitos até que seja invalidado, se for o caso, pela via administrativa ou judicial, o que não ocorreu neste caso.

Por fim, se faz necessário ressaltar que a reintegração de posse da aldeia evidencia o caráter devastador da política de especulação imobiliária vigente em toda a cidade de São Paulo. A área em questão vem sendo alvo de uma grande valorização fundiária, portanto a demarcação da região é uma medida extremamente necessária para garantir o direito à terra e ao modo de vida tradicional da comunidade ali presente. Enquanto a área não é demarcada, os indígenas sofrem constantes ameaças, como a ação de reintegração de posse em questão.

Diante do exposto, caro professor, contamos com o senhor para a realização de um voto que vise utilizar o direito como ferramenta para se atingir a justiça social. Sabemos que, ainda hoje, existem conflitos fundiários que adquirem contornos dramáticos, já que a correlação de forças envolvidas nesses litígios em geral é desigual. Dessa forma esperamos que o senhor adote uma postura que nos faça acreditar que o direito transcende os papéis frios de um processo e é capaz de atingir pessoas de forma a ajudá-las e a dá-las condições justas e dignas de vida.

Assinam esta carta:

  • Serviço de Assessoria  Jurídica Universitário (SAJU)
  • Centro Acadêmico XI de Agosto
  • Clínica de Direito Ambiental Paulo Nogueira Neto (CPaNN)
  • Quilombo Oxê
  • Centro Acadêmico Florestan Fernandes – FESPSP

 

 

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