O Senhor é o Deus Desconhecido
que oculta sua face luminosa:
atrás dos sacrifícios perpetrados
em nome da perfeição e da santidade;
atrás dos meandros tortuosos e indecifráveis
de teorias teológicas especulativas;
atrás do formalismo ritual e hermético
de uma liturgia rígida e fossilizada;
atrás do ruído vazio e vácuo da oração
que não passa de palavras despidas da Palavra;
atrás do sussurro rumoroso de devoções
que não sabem senão repetir fórmulas prontas.
O silêncio da escuta, atento e reverente,
constitui terreno fértil para a Palavra:
nesse solo aparentemente infecundo,
e tão somente nele, é que ela se faz ouvir:
cria, liberta, produz, ilumina e conforta;
da mesma forma que é na noite mais escura
que estrelas adquirem maior brilho;
ou que é na terra mais árida e pedregosa
que a flor ganha vestimentas mais belas;
ou ainda que no deserto mais calcinado
um oásis refrescante espera o peregrino.
De pouco serve o som metálico dos sinos,
se o ouvido não for capaz de ler entre as badaladas;
de pouco serve o estridor múltiplo da orquestra,
se o coração não está sintonizado com a melodia;
de pouco servem a letra ou a rima do canto,
se nele não não houver o êxtase do místico;
de pouco serve a eloquência do pregador,
se em sua retórica houver mais brilho do que luz.
Um véu tênue esconde o rosto do Pai
quando a criatura, em lugar de se ver como filho,
pretende rivalizar com o Senhor da História;
o céu permanece distante, surdo, mudo e cego,
quando a inteligência, ansiosa e cheia de curiosidade,
não conhece antes a nudez e pequenez de si mesma;
Deus recusa-se em revelar sua única Palavra
quando o espírito costura argumento sobre argumento,
esquecendo que o mistério habita na quietude;
O TODO se ausenta, transformando-se em nada,
quando o nada pretende explicar tudo e todos,
sem atentar para o segredo de coisas e pessoas.
Pe. Alfredo J. Gonçalves, cs – Rio de Janeiro, 10 de agosto de 20219