“O país vive em suspensão”, afirma Inácio Neutzling

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Por Núbia Maria da Silva, imc | 13.07. 2016| Inspirado em análises e reflexões do filósofo Vladimir Safatle sobre o momento de triplo esgotamento: de uma era histórica, de um modelo de desenvolvimento e da esquerda brasileira, o padre jesuíta professor Dr. Inácio Neutzling desenhou, no segundo dia da Assembleia Nacional da CRB, uma tela do “Brasil em Suspensão”, numa leitura de cenários sociais contemporâneos. Pintou, em várias cores, os esgotamentos da imaginação política.

Segundo Neutzling, a era histórica é a República. Acabou em 2013, como esgotamento da “Nova República”, nascida da união do PMDB e o PFL para eleição de Tancredo Neves. Tal união selou a história do Brasil até os dias atuais. Adotou modelos de relação com núcleos empresariais. Transformou-se num modelo de corrupção institucionalizada que perpassou por todos os partidos políticos. Chamou o regime de governabilidade: “sistema de travas”, não há como passar grandes reformas dentro de uma coalizão. Isso é atraso!

O professor coloriu a tela exemplificando: treze anos de um governo de esquerda com as pautas tradicionais do reformismo social-democrata sequer sendo cogitadas na discussão da redução da jornada de trabalho de 44 horas semanais, enquanto boa parte do mundo tem 40 horas e alguns países têm até menos de 35 horas.

O esgotamento do “lulismo”, o modelo de desenvolvimento brasileiro e o ápice da Nova República foram os matizes que Neutzling apresentou, em alto relevo, conseguindo fazer o melhor no sentido de aproveitar o sistema de travas e passar a um programa mínimo de assistência social: tirar 36 milhões de pessoas da miséria e da pobreza e colocar em ascensão uma classe média pobre, mas que tinha poder de compra.

As manifestações de junho de 2013, quando milhares de pessoas foram para as ruas exigir mudanças, inicialmente para contestar os aumentos nas tarifas de transporte público, foram desenhadas no centro do marco histórico da tela: um “tapa na cara” de todo mundo! Aqui nenhum ator político foi capaz de ouvir as demandas, tanto à esquerda quanto à direita.

Por isso, a afirmação “o país vive em suspensão” no ar, à, “espera de…”, incapaz de incorporar demandas de justiça social, deixou a obra de arte da conjuntura sem moldura. O Brasil estava paralisado (junho de 2013), menciona Neutzling. Assim, juntaram-se o fim da Nova República e o esgotamento de desenvolvimento econômico da esquerda brasileira. Não entende mais a necessidade de esperança dos jovens e não tem nada para lhes propor.

Com isso, o expositor/pintor rabiscou uma questão. Trouxe presente o filósofo Kant: o que é lícito esperar? Relembrou que estamos em processo de desconstrução contínuo de tudo; em crise das mediações com a democracia representativa que é também a crise ética. Afirmou que as forças políticas tradicionais, hoje quase totalmente deslegitimadas diante do povo que as elege, estão no vazio da representatividade que pode levar ao perigo da antipolítica e pode ser capitalizada de diversas formas, tendo em comum a rejeição em bloco de todo o sistema de mediação e variando em termos de uma reunificação à direita ou à esquerda. Também uma fragmentação pluralizante que organizaria, em termos utópicos e de outro modo a política, saindo do eixo da negatividade absoluta. Mas Neutzling coloriu a tela, em cores branco e verde, para não perder a esperança mesmo com a moldura “suspensa no ar”, para que o observador artístico-político-religioso-social redescubra, no tempo atual, a confissão, que foi desenhada no artigo do teólogo italiano Vitor Mancuso. Nele percebe-se o ponto específico do nosso tempo: a dificuldade, talvez até a impossibilidade, de confessar o próprio mal, declarando-o publicamente como tal e encontrando percursos de reforma e de expiação do mal social do qual a humanidade ocidental se acha presa.

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