Migrações e Sínodo Amazônico

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Pe. Alfredo J. Gonçalves, cs

O movimento cada vez mais complexo de migrantes no extenso território amazônico, como não poderia deixar de ser, esteve presente nos debates sobre o Sínodo Amazônico. Diz textualmente o documento final: “Um fenômeno para abordar são as migrações. Na Região Amazônica, ocorrem três processos migratórios simultâneos. Em primeiro lugar, os casos de mobilidade de grupos indígenas em territórios de circulação tradicional, separados por fronteiras nacionais e internacionais. Em segundo lugar, o deslocamento forçado de povos indígenas, camponeses e ribeirinhos, expulsos de seus territórios, e cujo destino final costuma ser as zonas mais pobres e pior urbanizadas das cidades. Em terceiro lugar, as migrações forçadas inter-regionais e o fenômeno dos refugiados que, obrigados a sair de seus países (entre outros, Venezuela, Haiti, Cuba) devem cruzar a Amazônia como corredor migratório” (nº 12).

Alargando essa visão da mobilidade humana, podemos incluir os “ciclos da borracha” (primeiro, na virada do século XIX para o século XX; em seguida, logo após a Segunda Guerra Mundial), ademais da clamorosa ocupação da Amazônia durante o período da ditadura militar. Tudo isso engendra na região amazônica deslocamentos humanos intensos e recheados de armadilhas. A extração da borracha em dois “ciclos” atraiu para o interior da floresta amazônica cerca de meio milhão de nordestinos, os quais, com o passar do tempo, irão se converter nas populações ribeirinhas. Já a ocupação desse imenso território aparentemente “vazio” (“ muita terra sem gente para muita gente sem terra”, como alardeavam os militares), gerou uma série de tensões e conflitos entre posseiros, povos indígenas, comunidades quilombolas, de um lado, e, de outro, representantes dos latifundiários e das mineradoras. Contam-se às dezenas o número de mártires, agentes e trabalhadores, nessa luta pela terra.

Passemos novamente a palavra ao documento final do Sínodo: “O deslocamento de grupos indígenas expulsos de seus territórios ou atraídos pelo falso brilho da cultura urbana, representa uma especificidade única dos movimentos migratórios na Amazônia. Os casos em que a mobilidade destes grupos se produz em territórios de circulação indígena tradicional, separados por fronteiras nacionais e internacionais, exige atenção pastoral transfronteiriça capaz de compreender o direito à livre circulação desses povos. A mobilidade humana na Amazônia revela o rosto de Jesus Cristo empobrecido e faminto (cf. Mt 25, 35), expulso e sem lugar (cf. Lc 3,1-3), e também a feminização da migração que faz com que milhares de mulheres sejam vulneráveis `”trata” de pessoas, uma das piores formas de violência contra as mulheres, e uma das violações mais perversas dos direitos humanos. O tráfico de pessoas, vinculado à migração, requer um permanente trabalho pastoral em rede” (nº 13).

Duas observações se destacam. A primeira, de natureza teológico-pastoral, retoma as célebres palavras do Documento de Puebla (1979) sobre “as feições sofredoras de Cristo na América Latina” (cf. DP, n. 31-39), agora identificadas com o rosto da “mobilidade humana”, com destaque para a presença e a vulnerabilidade das mulheres, associadas ao tráfico e exploração de pessoas humanas. Fazem lembrar o Senhor Jesus, “faminto, expulso e sem lugar” – sem terra, sem trabalho e sem teto – que rompe fronteiras e erra de um lado para outro, em busca de um solo que possa chamar de pátria. 

A segunda observação, relativa à prática sócio pastoral e política, alerta para o tipo de ação evangelizadora e de método a ser utilizado nesses complexos fronteiriços. Sublinha-se então a necessidade do trabalho em rede. Aqui relembramos o Documento de Aparecida (2007), segundo o qual o tema da mobilidade humana deve ser uma preocupação não somente das Igrejas de destino, mas também das Igrejas de saída, sem esquecer os entraves e adversidades das rotas de trânsito. “Os migrantes devem ser acompanhados pastoralmente por suas Igrejas de origem e estimulados a se fazer discípulos e missionários nas terras e comunidades que os acolhem, compartilhando com eles as riquezas de sua fé e de suas tradições religiosas. Os migrantes que partem de nossas comunidades podem oferecer valiosa contribuição missionária às comunidades que os acolhem” (Doc. Ap, n. 415).

Pe. Alfredo J. Gonçalves, cs – Rio de Janeiro, 12 de novembro de 2019

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