Irmã Maria Goreth fala da missão no Haiti e da REMIS

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Irmã Maria Goreth Ribeiro dos Santos voltou, recentemente, ao Brasil, da missão em território haitiano. Membro da Rede Missionária Intercongregacional Solidária – REMIS, esteve durante dois períodos em Porto Príncipe, capital do Haiti. O primeiro, de 2013 a 2015. Voltou ao Brasil, aqui permanecendo seis meses e, depois, retornou e ficou de 2015 a 2021, totalizando 8 anos de missão. A missionária conversou com a CRB e contou sua experiência neste período de serviço junto ao povo da cidade caribenha.

Quais foram os aspectos marcantes junto ao povo do Haiti?

Irmã Maria Goreth – Foram muitos, mas eu destacaria o trabalho com as mulheres. São mulheres de garra, determinadas, com muitas dificuldades… porque lá é um país muito pobre que depois do terremoto ficou mais pobre ainda… São mulheres que muitas vezes sofrem violências, mas que mesmo assim tem muita garra, muita determinação, pra poder dar conta de trabalhar e assim ajudar a família… Digo, trabalhar no sentido de ir pra rua, de lutar, porque trabalho formal não tem. Então elas saem pra vender doce, bolo, o que tiver pra poder ajudar os filhos. Porque no Haiti […] não tem escola, nem hospital gratuito, não existe nada que é “social” e gratuito pra população… E acho que outra situação que é marcante no Haiti é a severa desnutrição que as crianças sofrem, então a fome é destruidora… Então, a gente trabalha junto com a pastoral da Criança, produz as farinhas com essas mães, ensina como trabalhar essa nutrição. Nós fazemos 24 tipos de farinhas, tudo manual, ralando (a farinha) com elas, botando pra secar, tudo de forma muito manual, bem primitivo mesmo, e isso tem salvado vidas. Já salvamos muitas crianças que chegavam com três anos, pesando dois quilos… dois quilos e meio, como um recém-nascido. Muitas vezes essa desnutrição era tão severa que a gente tinha que arcar pagando hospital, porque a criança já estava cheia de inflamação, infecção e precisava ficar internada. Mas com a graça e ajuda do povo brasileiro, das igrejas, das comunidades, a gente conseguiu salvar muita criança.

Ouvindo você falar, Ir. Goreth, como missionária, lembramos dos terremotos e furacões, frequentes no Haiti, recordamos, inclusive, a Dra. Zilda Arns, que morreu ali implantando a Pastoral da Criança…

Irmã Maria Goreth – Sim, a Pastoral da Criança está implantada… não está em pleno vapor por falta de recursos que são limitados, mas se busca trabalhar. A gente vê que as paróquias estão tentando, mas a situação de fome e de miséria dificulta. Não é fácil, mas as pessoas são lutadoras… Dra. Zilda deixou uma semente que requer de nós, religiosos e leigos engajados, fazer com que esta semente frutifique e possa criar galhos, flores e frutos. Com certeza, o espírito dela continua, e isso tem salvado vidas, graças a Deus.

Como funciona a Comunidade Intercongregacional Nazaré?

Irmã Maria Goreth – Participei desde o início. Quando cheguei lá, as primeiras já estavam. E é bem interessante, abrem-se os horizontes. Muitas vezes, a gente acha que só dá para viver o próprio carisma, em nossa congregação, com os irmãos que a gente já conhece. Como missionários, nos desacomodamos, saímos disso e abrem-se horizontes. Aprendemos a conhecer carismas diferentes, aprendemos a respeitar, partilhar e se enriquecer com os carismas diferentes. Aquilo que a gente traz da nossa própria congregação não se perde… Contribui para que o nosso carisma se fortaleça mais, enriqueça e possa construir o Reino de Deus. E é bonito saber que várias congregações dispõem de irmãs para a missão. Eu acho que o mais bonito é isso: a missão. O Reino de Deus é um só. A Igreja é uma só. E a missão é uma só. Então, lá onde está se perdendo uma vida, deve ter uma consagrada para salvar. Isso é bonito, faz com que a gente supere qualquer atrito, ou dificuldade humana que todas nós temos, em função da missão. E temos como a base da nossa vida, a Palavra de Deus que nos guia e nos conduz como religiosas.

A Comunidade Intercongregacional Nazaré tem um local próprio?

Irmã Maria Goreth – No começo, as primeiras irmãs sofreram bastante. Elas moraram em orfanato, num quartinho doado pelos padres. Só não moraram debaixo de árvore. Elas entraram em casas que não tinham nada, começaram do zero… a língua diferente, o francês e o crioulo. Elas foram as primeiras grandes heroínas. Nós chegamos e já encontramos tudo arrumadinho, encontramos uma casinha que era de aluguel. Depois do terremoto, foram feitas várias casinhas, tipo quitinete, para os voluntários que estavam chegando de vários países. Então tinham essas casinhas que um padre italiano fez para receber os voluntários e a irmã Marian, que na época era presidente da CRB, em diálogo com os padres scalabrinianos, conseguiu duas casinhas para que as irmãs pudessem morar. Agora, depois de 10 anos, graças a Deus, as irmãs deram um segundo passo muito importante, a casa no local de trabalho, na inserção, numa vila, em um bairro junto com os pobres. É uma casa de inserção. Acredito que é um modelo pro Haiti, porque lá não existem religiosos na inserção. É uma novidade. Então, a gente está fazendo essa experiência, morando junto com os pobres[…] bem pertinho do projeto que a gente trabalha.

Em que consiste o projeto?

Irmã Maria Goreth – Quando fomos, irmã Marian sonhava muito que a gente trabalhasse a questão da economia solidária. Quando as primeiras irmãs chegaram, estava tudo destruído pelo terremoto. A primeira coisa, era a questão da fome. As Irmãs foram para roça, plantaram cebola, tomate, abóbora, para saciar a fome mesmo. As pessoas iam conversar com a irmã, que era psicóloga, e desmaiavam. Quando ela conseguia ressuscitar aquela pessoa, ela dizia: “Irmã, tem 3 dias que eu não como”. Então, como fazer um atendimento com a pessoa assim? Passados 4 anos quando eu cheguei, a gente começou a pensar num projeto de economia solidária nesse bairro, numa área “desértica”. Ali, a gente começou a trabalhar o projeto de economia solidária. As mães e as mulheres começaram cursos de bordado, de padaria. Trabalhamos artesanato e costura, vários cursos que pudessem dar habilidades para que mesmo que a gente saísse de lá, eles ficariam com aquela habilidade. E esse curso fez com que as mulheres gostassem muito do que estavam fazendo e, hoje, fazem blusas, toalhas bordadas, muito bonitas que vem pro Brasil. Tem muitas religiosas usando os bordados das mulheres haitianas. Os jovens trabalham na parte de artesanato com coco, que lá tem muito. Todo ano tem grupo de costura de homens e mulheres e também o trabalho da multimistura, que, de semana em semana, a gente faz as farinhas para depois distribuir para as crianças.

Você pertence a Rede Missionária Intercongregacional Solidária. Em que consiste e o que significa ser membro da REMIS?

Irmã Maria Goreth – O trabalho no Haiti foi pensado para 10 anos, como foi no Timor-Leste. Após 10 anos, começamos a pensar na continuidade. O papa já fala que as congregações tem que se unirem. Hoje, os membros estão diminuindo, as vocações estão diminuindo, as congregações estão fechando escolas, orfanatos, hospitais, casas, porque não tem membros, então vamos nos unir, vamos trabalhar juntas. E foi com esse pensamento que se formou uma equipe, e que hoje é a REMIS, um grupo de congregações – duas superiores gerais, uma conselheira, eu, que vim do Haiti, e outra irmã que também veio do Haiti. Cinco pessoas e a CRB que faz essa passagem, contribuindo por um tempo. Então, em vez da CRB coordenar, vai ser esse grupo de congregações. A REMIS é bem mais ampla. Na última assembleia da CRB, foram 70 congregações que se inscreveram para participar. Destas 70 congregações, algumas vão ajudar contribuindo com dinheiro, outros vão contribuir com orações e outras vão contribuir enviando irmãs para a missão. Cada uma vai contribuir naquilo que pode. Esse grupo é o que está mais próximo, coordenando. Essa contribuição é por dois anos. Queremos que, depois, outras congregações possam assumir.

E se alguém quiser ir para missões noutro país, além do Haiti, a REMIS também acompanha?

Irmã Maria Goreth – Ainda não, porque a gente está se organizando no Haiti. A CRB Nacional tem Missão em outros países, a CNBB tem missão em alguns países da África… Por enquanto, a REMIS está encaminhando esse projeto.

E para finalizar a nossa conversa, que mensagem você deixa para todos os cristãos que são chamados a serem discípulos e missionários de Jesus?

Irmã Maria Goreth – Não tenha medo. Você só vai ganhar, vai crescer. Jesus abre caminhos. Às vezes, a gente não consegue ver a luz logo no começo, mas a luz está lá. Quando você chega mais na frente aquela luz se abre e tudo vai lhe conduzir a fazer aquilo que Deus está pedindo. Não tenha medo, porque Deus está no comando, Ele que nos encaminha. Ele diz: “Tome a sua cruz e siga-me”. Então, você leva a sua Cruz e segue que vai dar tudo certo. Não deixe que o medo lhe paralise. A vontade de Deus é que a gente faça o bem no lugar em que nós estivermos, seja no Haiti, na África, no Brasil ou na Amazônia. É lá que você tem que fazer o bem, ser humano até as últimas possibilidades como Jesus foi humano, amando.

Para quem se sente chamado por Deus e deseja realizar ações missionárias, entre em contato com a CRB Nacional através do telefone: (61) 3226-5540.

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